Crônica da cidade – Pedreira Lomas – Linha B

Crônica da cidade – Pedreira Lomas – Linha B
  16 de janeiro de 2019
Coordenação de textos: Antonio Carlos Pimentel / Redação: Sue Anne Calixto / Fotos: Fernando Sette Câmara – Todos os direitos reservados / All rights reserved

Um passeio de ônibus te faz descobrir o mundo.

Foi o que percebi pegando um dos ônibus que mais dá voltas em Belém: o Pedreira Lomas-linha B. O meu medo de puxarem meu celular pela janela me impediu de mexer nele durante a viagem. Mas acredito que isso trouxe coisas boas.

Pude observar as diferenças de um extremo a outro da cidade.

Esse ônibus sai de Ananindeua e vai ao centro de Belém, e nesse caminho tem uma cidade inteira a ser descoberta. A parte de Ananindeua, até a Pedro Miranda, apresenta uma Belém mais moderna, com seus prédios grandes e ruas largas, com engarrafamentos e seu amontoado de pessoas. É o cotidiano de uma cidade grande, com todo o seu esplendor e estresses.

Mas o que realmente me tocou foi a partir dali, quando o ônibus atravessa a Doca e entra no meio das ruas antigas, com seus casarões, ainda existentes, mas nem tão preservados. Deu uma tristeza ao perceber prédios que poderiam ser importantes pontos turísticos pichados e esquecidos. É, Belém infelizmente tem dessas.

Mas tudo bem, essa parte logo ficou para trás ao perceber que o ônibus me levaria a uma viagem pela cidade e seus pontos turísticos. Mesmo que de forma rápida. Talvez o gostinho de quero mais me fizesse escolher um dia para voltar.

A Estação das Docas foi o primeiro ponto e desejei absurdamente que fosse fim de tarde, para que assim eu pudesse admirar o meu pôr do sol favorito. Também foi meio inevitável não desejar parar ali para tomar um sorvete da Cairu, mas eu sabia que a vida precisava seguir.

Ao passar correndo pelo Ver-o-Peso, me lembrei do início de um curso cheio de expectativas, quando produzi trabalhos neste importante ponto da cidade, e o conheci em sua essência, quando entrei na faculdade. Nostalgia do primeiro almoço com açaí e peixe frito, do primeiro medo de ser assaltada, e da tão famosa frase escrita na lateral do Solar da Beira que eu sempre quis saber o significado. “Daqui, em 1976, acenei pra você”. Um dia descubro.

O próximo ponto que me chamou a atenção foi o Forte do Presépio, que por alguns instantes me fez lembrar de uma aula de história que vivi ali, e que me fez enxergar o local com olhos do passado.

Quando o Mangal das Garças se aproximou, só consegui pensar em quanto tempo eu fiquei sem ver esse lugar. E por quanto tempo eu apenas passava direto por ele para ir em uma casa de show que fica em uma vila ao lado. A memória de um dos lugares mais belos da cidade estava se perdendo, e o pior, para mim mesma.

A viagem também me levou a um lugar que não é conhecido como um ponto turístico, mas que para mim é importante. Toda vez que passo nesse local junto com a família o meu pai passa devagar por uma casa e diz: “Era aqui que eu morava”, Quando eu reconheci a casa nesse passeio, espontaneamente abri um sorriso.

A viagem também me levou à Praça da República. Enquanto a observava, tentei lembrar quantas vezes já havia ido lá e por quais diferentes razões. Já fui na feirinha aos domingos, para o Pavulagem em junho, para vender chopp com o objetivo de arrecadar dinheiro para a formatura, para ajudar em uma feira do livro. Mil e uma diferentes razões e ainda assim tive a sensação de ser insuficiente.

Ao final da viagem, pensando que nada mais poderia me chamar atenção, quando estava quase perto da parada, subiu no ônibus um moço vendendo pipoca que por algum motivo me chamou atenção. Algo me comoveu nele, talvez a sinceridade que eu tenha visto em seus olhos e em suas palavras. Eu só conseguia pensar em como um ônibus também pode ser toda a vida de alguém.

Durante o passeio, foi inevitável perceber que eu estava sendo a única pessoa a observar de perto tudo aquilo. Havia um celular, uma apostila, um livro ou uma conversa para roubar a atenção.

Eu desci e agradeci por ter medo de usar o celular no ônibus. Do contrário, deixaria de conhecer um mundo novo, de sentir saudade, e de lembrar de como a minha cidade, apesar dos pesares, continua linda e tem lugares mágicos e nostálgicos, que podem ser observados pelo simples espaço de uma janela.